ESPECIALISTAS: Quando cobria o caso Silveirinha, em 2003, participei de uma daquelas conversas que ficam na cabeça do repórter até a aposentadoria. Estávamos, jornalistas e advogados dos acusados, esperando mais uma audiência na Justiça, e um dos defensores contou que, uma vez, foi procurado pela família de um traficante baleado, preso e hospitalizado. Ele não queria pegar essa defesa e, por isso, condicionou sua ida ao hospital, apenas para conversar, ao pagamento de R$ 10 mil. Recebeu, em resposta, R$ 10 mil e mais R$ 10 mil. Foi conversar, mas, ainda assim, resistiu. Pediu R$ 50 mil para entrar na ação, apenas como começo de conversa. Recebeu os R$ 50 mil e mais R$ 50 mil. “Aí eu peguei o caso, né?”, relatou o causídico, sorrindo. Não quero entrar aqui em julgamentos morais, mesmo porque defendo o princípio do direito à defesa, ao contraditório e à presunção da inocência. Mas acho que episódios assim têm que ser levados em conta quando advogados criminalistas, em meio a debates como o do aumento de penas, suscitado pelo martírio do menino João Hélio Fernandes, vêm a público dizer que o aumento das punições não compensa. Eles não são neutros, defendem interesses concretos, assim como os promotores públicos, policiais, religiosos, ONGs cidadãos – nessa discussão, ninguém é neutro. Aliás, em nenhuma discussão há inocentes. Isso deveria ser sempre lembrado pelos órgãos de imprensa, sempre tão zelosos ao ouvir “especialistas” que, em tese, saberiam mais que nosotros, comuns mortais.
# posted by Wilson Tosta @ 3:22 PM